Contratos de tecnologia e de comercialização de software precisam oferecer garantias ao desenvolvedor
Lorena Ribeiro*
Os contratos são instrumentos jurídicos que existem há mais de um século. Seu conceito e sua função social estão intimamente ligados à definição econômica que lhe é dada: instrumento que operacionaliza a circulação de riquezas e acomodação de diversos interesses. É importante destacar que o contrato não é só o documento escrito que formaliza obrigações, mas é, sobretudo, um acordo de vontades dirigida a determinado fim. O Direito, portanto, atenta-se constantemente às mudanças sociais e econômicas que demandam, cada dia mais, um novo desafio aos instrumentos contratuais.
Nessa lógica, atravessa-se momento de ampla evolução tecnológica, iniciada pela revolução digital, na qual a tecnologia se apresenta progressivamente presente em nossas relações sociais e nas atividades econômicas. O quadro contemporâneo é de constante transformação, de modo que requer do ordenamento jurídico atual uma rápida adaptação para atender suas necessidades.
Atualmente, há previsto em nossa legislação diferentes espécies de contratos, que se agrupam em categorias distintas consoante às suas particularidades. É importante destacar que as espécies variam de acordo com o negócio jurídico a ser realizado, e apesar do Código Civil prever diversas categorias, a legislação e normatização jurídicas estão em processo de adaptação e recepção acerca das questões de tecnologia, exigindo maior preocupação daqueles que atuam nesse mercado.
Como exemplo, a transferência de tecnologia, ou Contrato de Fornecimento de Tecnologia, tem como principal objeto a técnica e conhecimento exclusivo utilizado para produção e/ou comercialização de bens. A transferência desse conhecimento não implica no direito de titularidade do bem, ou seja, o detentor da tecnologia continua sendo o mesmo. Para cada tipo de haverá um contrato de licenciamento ou de cessão, a depender do propósito da transferência. Qualquer que seja a modalidade, deverá haver registro no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI).
Para a transferência de propriedade de bens tecnológicos, a modalidade utilizada é a cessão, na qual o detentor da tecnologia transfere a titularidade do direito de propriedade intelectual, ou seja, não terá mais a tecnologia e nem os direitos que dela decorrem, como por exemplo, de licenciamento de uso, ou de outra qualquer transferência. Entretanto, dentre as formas de negociação de tecnologia, a comercialização de software destaca-se no mercado tecnológico e também no ordenamento jurídico.
Os softwares são programas que comandam o funcionamento de um computador. Há algumas décadas os programas somente eram comercializados por fabricantes de hardwares (equipamentos) e vinham pré-instalados, ou seja, o consumidor o adquiria na compra de um equipamento. Ocorre que, com a evolução da tecnologia, os softwares passaram a ser comercializados em separado, diretamente por seus desenvolvedores, surgindo, dessa forma, um novo modelo de contratação. O mercado de software tem operado, sobretudo, através do Contrato de Licença de Uso, conforme definiu a Lei nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998. Esse modelo consiste em uma modalidade de negócio jurídico através do qual alguém, denominado licenciante, concede ao licenciado o direito de exploração econômica e/ou utilização do programa de computador.
No licenciamento ocorre a transferência do direito de uso, fruição, e gozo daquela tecnologia, por isso, tendo em vista a natureza e a função dos softwares, essa é a modalidade mais comum para quem comercializa tais tecnologias. Nessa modalidade, o detentor da tecnologia do software, desenvolvedor ou licenciante, estabelece junto ao licenciado uma forma de uso, bem como pode ou não determinar o tempo e algumas formas de utilização.
É natural perceber que, para aqueles interessados em negociar a tecnologia de software a fim de obter interessados na utilização de seu programa, o contrato de licenciamento de uso permite exatamente o ajuste de (i) quantidade de usuários do licenciado, (ii) valor por unidade ou por conexão, (iii) inclusão ou não de manutenção evolutiva, (iii) atualizações do sistema e formas de cobrança, (iv) sistema de manutenção, e todas as matérias afetas ao uso do software, que fazem do contrato não apenas uma formalidade para concretizar o uso e os direitos do licenciado ou do licenciador, mas que abrangem todas as questões, inclusive técnicas, que devem vigorar a tempo e a modo na duração do contrato.
Desse modo, o contrato de licenciamento de software vai além de uma simples burocratização para licenciado e licenciante, mas um instrumento que permite delimitar os limites, regras, valores, formas de uso, e, inclusive, pode abrir espaço para novas negociações, como no caso de manutenção evolutiva, por exemplo. Apesar disso, é comum que alguns contratos deixem à parte termo de confidencialidade quando se trata de questões sigilosas e tecnologia da informação, mas como um apenso ao contrato principal com todas as informações necessárias. Portanto, a utilização do instrumento contratual proporciona segurança ao desenvolvedor de software, evitando, dessa forma, vulnerabilidade de dados, utilização indevida e a própria comercialização ilegal da tecnologia.
*Advogada do escritório Bruno Junqueira Consultoria Tributária e Empresarial